Primeira pessoa: Uma saudade recorrente
De repente, num processo de um longo tempo, o fim se concretiza. Acabou mesmo, não tem volta. Cada pessoa caminhando pra um lado, às vezes lado a lado, mas não mais juntas como antes. O desentendimento que culminou no fim é irreconciliável. Acabou mesmo. Ela não vai mais estar aqui. Mas um incômodo substituto entra naquele lugar: A saudade. Mas esta não vai embora, se torna indissociável de quem nós somos, assim como o passado com a pessoa que já não está mais ali.
Lidar com a impermanência não é fácil, principalmente quando esperávamos que algo ou alguém fosse ser parte da nossa vida eternamente. Não era pra gente criar essa ilusão. Usando a lógica, a gente já sabe que tudo vai acabar um dia.
Eu tenho um histórico de saber que o amor acaba (será que eu atraí isso de tanto que repeti aquela crônica do Paulo Mendes Campos na adolescência?). E quando eu digo amor, eu tô falando de relacionamentos conjugais (por falta de termo melhor que me venha à mente agora). Mas a gente não espera muito isso de outros tipos de relação. Aprendemos que nossos pais vão nos amar a vida inteira e a gente deveria amar eles pra sempre também. É sempre assim que acontece, se a gente for realmente pensar? Não precisamente. Afinal, existem brigas, desentendimentos e no fim das contas, pais deserdam filhos, filhos deixam de falar com progenitores. Mas de algum modo, a relação está lá para sempre.
A amizade, no entanto, dói muito quando acaba. Porque a gente escolhe amizades com mais leveza que o amor, talvez até com mais consciência e racionalidade. Não é um laço que normalmente se pressiona por um compromisso. Compromissos sofrem mais cobranças e, consequentemente atrito. A amizade não, ela se estreita com liberdade, com bons momentos e apoio quando a gente precisa e presença quando a gente está feliz. Sempre vi meus amigos como pessoas que, longe ou perto, estariam sempre comigo, de algum modo, na minha vida.
Mas amizades também acabam. Porque a amizade, afinal de contas, é também um tipo de amor que nossa sociedade desconsidera enormemente. E o amor acaba.
Vivi uma amizade muito profunda e intensa, companheirismo pra quase todas as horas, mas quebrada algumas vezes. No fim, não dava mais pra remendar e me afastei. Pareceu de repente, porque não teve conversa demarcando o fim, só um afastamento até que uma não estivesse mais no horizonte da outra, mas foi um processo longo e arrastado que enfim trouxe o alívio de acabar, mesmo que tenha vindo com incômodo. Hoje não vejo possibilidade nenhuma de ver aquela relação novamente inteira, pelo menos não como era antes ou não de uma maneira que custe ainda mais esforço e dor que o afastamento, que já está confortável.
O que mais me dói não são as mágoas que tornaram insuportável permanecer no mesmo caminho. Dói ter perdido a companhia para tantos momentos, ter tantas memórias boas agora enevoadas pela mágoa, a tristeza e pela saudade.
A falta é um buraco muito difícil de se tampar. Não tem quem cuide de mim igual, não tem quem me apoie e defenda da mesma maneira. Não tem nem ninguém que discorde comigo tão piscianamente. Não tem quem fale dos meus assuntos favoritos a qualquer hora como a gente falava. Não tem. A saudade não passa.
Tem sempre uma vontade no fundo do meu peito de voltar àquele tempo sem mágoa, porque cada momento bom valeria um retorno. Mas ainda não me sinto pronta pra ver novamente aquela pessoa que já é outra, assim como eu sou completamente diferente depois e por causa desse afastamento. A amiga que eu tive foi embora. Eu, aquela amiga que fui, também já não estou mais presente.
A ausência, no entanto, está aqui. Ela não foi embora. A saudade também não.
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