Favoritos das premiações 2021 - Parte I
Este post faz parte da série: "Não sei se alguém quer minha opinião sobre isso, mas aqui vai ela!" Antes das minhas opiniões sobre os filmes em si, um não tão breve comentário.
Ano passado foi o primeiro ano em que tive tempo pra fazer uma das coisas que mais gosto, pois consegui enfim sair totalmente da lógica do trabalho tradicional de carteira assinada (Caí na insegurança, leve precarização & autocobrança do trabalho autônomo? Caí, mas enfim, foi uma escolha minha que me fez bem e me desvinculou de regimes de trabalho e de sistemas de ensino aos quais eu já não me encaixava confortavelmente) e fiquei com sábados livres. Todas as manhãs dos sábados e domingos, e às vezes, às sextas à tarde e à noite, me dou ao luxo de assistir um filminho. Eu amo a sétima arte e sinto falta, entre tantas outras coisas, da magia catártica coletiva de se assistir a um filme em uma sala de cinema. Mas antes mesmo da pandemia, consegui me organizar pra separar esse tempinho pra assistir filmes.
Esse foi, então, o segundo ano em que me dispus a ver o máximo possível de filmes indicados às premiações mais importantes antes que elas acontecessem. Tudo isso pelo prazer de assistir os filmes em si, mas também pela alegria de concordar ou discordar dos comentaristas & também embarcar nesse tipo de conversa com minha irmã e minhas amigas que curtem filmes tendo mais propriedade. Desta vez, consegui me dedicar ao Oscar e também ao Globo de Ouro. Assisti muitas e muitas coisas e observei alguns pontos.
A primeira é que os filmes deste ano vieram muito mais carregados de questões políticas e sociais. De forma muito mais crítica e evidente do que antes, já que toda escolha acaba revelando intenções políticas de uma forma ou de outra. Isso fez com que eu me identificasse com uma quantidade muito maior de personagens do que anteriormente, ou, no mínimo, compreendesse com mais facilidade alguns sentimentos e questionamentos das pessoas retratadas na tela.
Isso deixou muito evidente pra mim o porquê de eu já não conseguir assistir séries e filmes com personagens padrão e menos ainda as estadunidenses. Não me identifico com aqueles conflitos e vivências, então as histórias passam por mim como se fossem nada. Quando sinto que as pessoas retratadas se afastam dos padrões, por mais distante da minha realidade que sejam, mais fácil é sentir empatia por aquelas formas de existência.
Artisticamente é incrível que agora vozes e visões de outros pontos de vista que não o do homem hétero, cis, branco e de classe média. Mas até que ponto um sistema que continua estruturalmente desfavorecendo quem quer que não se encaixe nessas categorizações está de fato reconhecendo o valor dos outros grupos ao conceder a eles algumas vagas para concorrer enquanto ainda segue premiando majoritariamente seus iguais? E porque é que nós, à periferia desse estilo de vida, estamos ainda nos importando com esse reconhecimento?
Acho que tenho percebido com mais clareza que por mais que a gente discorde do sistema e entenda que toda a estrutura dele deveria ser radicalmente transformada, dentro dele tem de haver justiça também. Isso fica evidente em tantas áreas, mas foi com essa observação em relação ao Oscar e ao Grammy (mas isso é caso pra depois) que a última gota d'água transbordou essa percepção de que temos que viver em um duplo combate. Eu não acho que uma mulher negra, por exemplo, ao receber um prêmio da academia vai mudar diretamente a realidade de todas as suas iguais, mas vai dar forças para que elas sobrevivam ao sistema como ele é, enquanto ele não muda. Representatividade importa? Claro, mas é tudo? Não, e não deve ser motivo de satisfação. Ela pode ser comemorada mas nossa euforia não deve nos deixar parar aí, nessa conquista. Paralelamente a esse mínimo de reconhecimento, devemos lutar para mudar tudo, para que cheguemos a um mundo sem a competição, com igualdade e justiça. Em que a arte possa enfim assumir seu real valor e não seja mercadoria, que não precise ser competitiva e sim expressiva.
Mas sinto que poucos conseguem perceber a necessidade de lutar por ambas as coisas. Muita gente comemora reconhecimentos como uma indicação ao Oscar ou mesmo uma vitória como se fosse tudo. Pode ser muito, mas tudo não é. Do outro lado, muita gente deixa também de admitir a importância que esse reconhecimento verdadeiramente tem dentro do sistema que ainda não mudou e por isso, vejo pessoas desprezando totalmente as injustiças que acontecem aqui, como se devêssemos deixar de lutar pra que as regras válidas no momento sejam seguidas só porque elas não são perfeitas e deveriam ser mudadas. É complexo e eu também não sei o que fazer. Pensar é um processo. E por enquanto, só cheguei até aqui no processamento dessas percepções.
E agora sim, vamos ao Anna Awards 2021!
Aqui não tem esse negócio de competição, tá todo mundo em primeiro, por motivos diferentes. Só decidi separar os filmes por categorias. Pode ler que não tem spoiler e os comentários são curtinhos.
Melhores experiências cinematográficas:
O som do silêncio
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Esta imagem foi escolhida simplesmente porque eu tenho um crush gigante pelo Riz Ahmed |
Eu achei interessantíssimo o uso dos sons e do silêncio pra que a gente possa acompanhar o personagem principal na jornada de perda auditiva dele. É um filme delicado, sutil e que termina deixando um gostinho doce em meio à amargura.
Uma noite em Miami
Assim como A voz suprema do blues e Meu pai, Uma noite em Miami tem um tom teatral, com roteiro minimalista e puramente baseado em diálogos, cenário reduzido, e é uma produção que depende totalmente das forças e sutilezas do seu elenco, muito competente por sinal. No entanto, a razão pra eu ter incluído aqui Uma noite em Miami é porque eu gosto muito da direção da Regina King, que faz de cada detalhezinho de cena ou de atuação ganhar importância. Eu senti que, além de dirigir os atores em cena, ela foi capaz de direcionar também o nosso olhar enquanto espectadores para pontos que fazem toda a diferença. E fez tudo isso de uma forma muito bonita visualmente.
Hamilton
Eu sempre acompanhei as pessoas falando sem parar sobre Hamilton. Eu sabia que era uma peça que deixava todo mundo louco e quando assisti ao musical, entendi finalmente o porquê. Não sei se diria que esse filme me trouxe uma experiência cinematográfica, já que ele é basicamente a filmagem de uma apresentação em teatro, mas foi uma grande experiência que transformou história em entretenimento sem esvaziar a importância dos fatos. Achei fascinante, e algumas músicas nunca mais saíram da minha cabeça, o que eu acho que é sinal de altíssima competência dos criadores desse musical.
Meu pai
Esse filme é sensacional e faz a gente acompanhar passo a passo a confusão mental do personagem, o que me deixou muito tensa, assustada, e, claro, confusa. Mais uma obra que depende de grandes atuações, porém acho que no caso desse, cada detalhezinho do roteiro, da direção, do cenário, dos figurinos e de tudo que aparece ou não em cena são pontos ainda mais cruciais pra passar ao espectador experiência. Pra mim, que sou amadora, me pareceu uma aula de como usar todos os recursos do cinema pra contar uma boa história.
Borat: A fita subsequente
Vocês estão chocades que esse filme está aqui nessa lista? Pois é, eu também! Eu não assisti o primeiro filme do Borat e tenho lá minhas questões com o filme, mas que experiência aterrorizante é sentir o desconforto com a realidade como ela é. E, sabe de uma coisa? Esse desconforto é necessário às vezes, mas eu não sei se todo mundo está preparado pra assistir esse filme.
Vem aí a parte II do Anna Awards, semana que vem. Aguardem!
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