Kriya-ativa: Yoga, os chakras e a escrita
Talvez você não saiba que apesar da minha formação em Letras e de hoje ter a escrita como profissão, o que paga minhas contas é Yoga. Ou talvez você saiba que dou aulas de Yoga mas não tinha nem ideia de que eu também escrevo. Então narrando bem brevemente como esses dois caminhos se cruzam na minha vida: eu sempre gostei de esportes, comecei a praticar Yoga quando não consegui conciliar faculdade, trabalho e ir diariamente à academia. Me matriculei numa aula para mover meu corpo mas descobri que essa prática trabalha diretamente também com a mente, nossas energias e espiritualidade. Depois de formada na faculdade, segui praticando (e voltei à academia e a tantas outras práticas físicas), mas passei a me embrenhar no Yoga a tal ponto que num momento de insatisfação com as possibilidades de vida como professora de inglês, decidi investir em um curso de formação de professores de Yoga.
Até então, Yoga seguia sendo uma prática para o corpo, embora eu já tivesse o conhecimento das dimensões além do corpo que eram acessadas com os exercícios. Foi bem especificamente no curso de formação com a minha cuidadosa e sábia mestra Karin Mandelli, que me aprofundei mais nos nichos espirituais, energéticos e mentais da prática. Não que eles sejam separados do corpo! Segundo essa sabedoria milenar, essas partes são indissociáveis na formação do nosso ser. Tudo que trabalhamos no nosso corpo material (e não precisa ser, necessariamente com Yoga!) reverbera também nas outras camadas do nosso ser.
Bem, vocês já devem ter ouvido falar várias vezes sobre os Chakras. O sistema do Yoga deriva de filosofias diversas que entendem o nosso corpo como uma sobreposição de várias camadas. Tantra, Samkya, os Vedas, tantos outros sistemas filosóficos e práticos das culturas asiáticas reconhecem os diversos invólucros que envolvem o nosso ser e é comum que os sistemas medicinais milenares e verdadeiramente tradicionais também reconheçam que temos além de um corpo físico, um corpo energético, um corpo mental e emocional e ainda um corpo sutil - sendo este último o que costumamos entender como alma. Existem divergências quanto a especificidades destes conhecimentos, mas existe uma coincidência na multiplicidade de culturas que entendem que no nosso corpo energético se localizam centros de energia chamados Chakras. Os saberes contidos nessa série de artigos são na verdade um compilado de informações diversas, vindas de múltiplas linhas de estudo indianas, organizadas de modo a trazer o que coincide nessas visões de mundo distintas. O que veremos aqui é o que há em comum, não só nas visões da cultura hindu, mas também em outros países da ásia: estudos da china, tailândia e japão têm percepções semelhantes do corpo.
Como anteriormente mencionado, segundo a cultura indiana que deu origem às práticas de Yoga, temos um corpo composto de camada física, uma emocional, uma mental, uma energética e uma sutil ou espiritual. No nosso corpo energético, - um intermediário entre o físico e o mental e emocional - temos determinadas energias reunidas em círculos, que no corpo físico coincidem com o eixo da nossa coluna vertebral. Existem diversas espirais energéticas espalhadas pelo nosso corpo, na verdade. Mas as principais são sete, concentradas ao longo da nossa coluna, mesmo que de fato estejam em um nível energético. Justamente por estarem neste intermédio, se conectam a áreas do nosso corpo físico e mental e sutil com facilidade. Então, é claro que quando mexemos de alguma forma com qualquer um desses corpos, acabamos mobilizando todas as nossas outras camadas, das mais materiais às mais sutis.
Todos estes centros, já se encontram, de certa forma, em harmonia. Caso não houvesse equilíbrio entre eles, nossos corpos estariam configurados de formas distintas. Obviamente, alguns de nós possuímos chakras que se ativam mais do que os outros a depender de circunstâncias internas e externas. Mas, no geral, mesmo que alguns deles se desequilibrem, a tendência, segundo essas sabedorias com o olhar mais voltado para os ciclos naturais, (E, lembrando, nós somos natureza também! Parte e todo dessa natureza) é sempre o equilíbrio e o retorno para nosso centro.
Mesmo que já estejamos com os chakras ativos e dentro de um certo equilíbrio, a cada época da vida um deles se aflora, nos convidando a desenvolver aspectos físicos e visitar questões psicológicas e emocionais. Essa sequência cíclica, de certa forma, é uma narrativa que acompanha a jornada de nossa vida e nos leva a uma evolução. Segundo essa teoria, a cada 7 anos, passamos a olhar para questões relativas a cada um dos sete chakras principais e vamos evoluindo enquanto heróis e heroínas de nossas próprias histórias. Entre os 0 e 7 anos, desenvolvemos questões da sobrevivência relacionados ao Muladhara Chakra, o chakra raiz. Dos 7 aos 14, aprendemos a lidar com as pessoas e entendemos quem somos a partir da existência do outro: questões que se relacionam ao segundo chakra, e assim por diante.
Recentemente, montei um grupo de estudos com alunes e interessades em conhecer as filosofias que embasam a prática de Yoga. Contei um pouco sobre a nossa jornada pelos chakras ao longo da vida e, por coincidência do destino, a escrita era algo em comum entre alguns presentes. Fernanda Rodrigues (Oi, Fê!) chamou a atenção para como a jornada da nossa vida - que vai perpassando as questões de cada chakra - acaba sendo bem parecida com a jornada do herói, a clássica fórmula narrativa tão comum em diversas formas de se contar histórias no ocidente. Essa série de posts que começa hoje, com este primeiro artigo, só existe porque ela sugeriu que eu escrevesse sobre outros aspectos da escrita conciliados com essa jornada dos chakras.
A ideia inicial era outra, mas acabei dividindo essa série em 7 partes, além desta primeira introdução, para falar sobre essas lições dos chakras para a vida que podemos aplicar no desenvolvimento de personagens: nossos heróis em suas jornadas. Nada do que virá é novo, mas creio que esse olhar que parte de ensinamentos de uma outra cultura pode nos ajudar a contar a mesma história de outra forma ou usar a mesma fórmula para contar outras histórias.
Assim como as culturas indianas, podemos sempre somar mais conhecimento e entendimento à nossa multiplicidade, e com isso espero ajudar a repensar a escrita com os próximos artigos dessa série.
A jornada dos Chakras continua na próximas semanas e trarei, além de reflexões e explicações, algumas propostas de exercícios de criatividade. Batizei a série de Kriya-ativa como uma forma de juntar estas duas ideias: criar é ação. Kri, em sânscrito quer dizer prosseguir no trabalho no dia-a-dia, mais um reforço da ideia de ação, mas também uma lembrança de continuidade nos nossos ciclos e de empenho no que desejamos desenvolver. Já a sílaba ya significa estar consciente daquilo que há de divino dentro de nós: a centelha invisível e indefinível de vida que nos torna quem nós somos, que vai muito além da nossa vontade, algo que é possível de se denominar alma ou inspiração. Que nosso Kriya seja ativo nas próximas semanas!
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